Plotino
Sempre gostei de filosofia, de
filosofar e do saber. Envolvida cada vez mais com a filosofia, não posso deixar
de citar Plotino, sua obra, “As Eneádas”, compilada por seu discípulo
Porfírio. Plotino é considerado por alguns como “a glória da filosofia
antiga”. Seu texto diz respeito à vida, a questões existenciais que moviam
a curiosidade do homem antigo e que excitam ainda mais a pesquisa do homem
moderno.
Precisamos desenvolver em nós a
sensibilidade para apreciar o Belo no Outro, na natureza, no Universo e na vida.
Hoje bebo esse tratado que elabora
os fundamentos da natureza da beleza, acerca do Belo.
Divido um pouco dessa perfeição com
vocês e recomendo essa obra para os que apreciam e amam a filosofia, o amor
transcendente e o Belo.
Abaixo alguns comentários sobre o Tratado:
A doutrina
fundamental de Plotino é a das três hipóstases, das três
substâncias, das três realidades eternas, embora elas procedam uma
das outras.
1) A realidade suprema,
o Deus de Plotino, é o Uno, o qual não é o
conhecimento (uma vez que este supõe a dualidade do sujeito cognoscente e do
objeto cognoscível - nem o Ser, mas antes a fonte inefável de todo ser e de
todo pensamento. Ele é todas as coisas e nenhuma delas. É aquilo de que promana
toda existência, toda vida e todo valor, mas ele próprio é de tal ordem que
nada podemos afirmar a seu respeito, nem a vida, nem a essência; é superior a
tudo e fonte absoluta de tudo.
2) Por que existem
outras hipóstases ? Por que esse Deus plotiniano, por que o
Uno não é único, por que se degrada na multiplicidade? É certo que não está
submetido a qualquer necessidade, não pode desejar coisa alguma - pois, desejar
é sentir falta de algo, e ele é plenitude. Mas o Uno é riqueza infinita,
generosidade sublime. A perfeição suprema se difunde em si mesma, tende a
engendrar outros seres que se lhe assemelham, ainda que menores. Assim como de
um fogo ardente as chamas se irradiam, assim ocorre com os seres emanados do
Uno. O primogênito de Deus é o Logos, a Inteligência. Essa Inteligência é o
princípio de toda justiça, de toda virtude e, o que é capital para Plotino, de toda
beleza. A Inteligência é que faz a realidade ter uma forma, na medida em que
ela é coerente e harmoniosa, na medida em que ela é Beleza. (nesta segunda
hipóstase encontramos algo das Ideias de Platão e
do pensamento que se pensa de Aristóteles)
3) Da Inteligência
procede a Alma, terceira hipóstase (que evoca o tema platônico
da alma do mundo, assim como o deus cósmico dos estóicos).
A Alma é a mediação entre a Inteligência, da qual ela procede, e o mundo
sensível, cuja ordem é constituída por ela. As almas individuais emanam dessa
alma universal. A alma humana também é uma parcela do próprio Deus presente em
nós.
Comentário das três
hipóstases:
O mundo material
representa o último estágio dessa "difusão" divina, o ponto extremo
onde morre a luz; é aqui que encontramos a opacidade da carne, o peso da
matéria, as trevas do mal. Todavia, enquanto o Uno dispersou-se, obscureceu-se,
abismou-se no múltiplo, este último aspira à reconquista da unidade, à luz e ao
repouso na fonte sublime. Ao movimento de procedência corresponde o impulso de
conversão pelo qual a alma, caída no corpo, obscurecida no mal, se assume e
tenta se elevar até o Princípio original.
Reservemo-nos,
todavia, de ver no plotinismo um dualismo gnóstico. O próprio Plotino escreveu
um tratado contra as seitas gnósticas. Para ele, não existe um mundo do mal,
rival do mundo do bem. O mal, para Plotino, nada tem de uma substância
positiva: "O mal não é senão o apequenamento da sabedoria e uma diminuição
progressiva e contínua do bem". A alma que dizem prisioneira do mal é
apenas uma alma que se ignora, é como diz Plotino, uma luz mergulhada na bruma.
O mal não é uma substância original, é só o procurado pelo reflexo do bem que
fracamente ainda brilha nele. Nesse sentido, livrar-se do mal, para Plotino,
não é, como para os gnósticos, destruir um universo para dar nascimento a
outro, mas antes encontrar a si mesmo em sua verdade. Não esqueçamos que é a
leitura de Plotino que, um dia, arrancará o jovem Agostinho de
suas crenças dualistas abeberadas no maniqueísmo.
Essa filosofia, no
entanto, não é absolutamente nova. Já no Timeu de Platão está colocada a questão de uma gênese do mundo; por outro
lado, a conversão plotiniana lembra a dialética ascendente de Platão. Em ambos os
métodos de purificação, a ideia do Belo desempenha importante papel. Todavia, a
obra de Plotino possui uma tônica de misticismo que é nova; sente-se aí, como
até então não se sentira ainda, o desejo e o esforço de uma alma que quer se
encontrar e ao mesmo tempo se perder no Uno universal e inefável. Esse
arrebatamento da alma, esse êxtase foi que impressionou Bergson ao ler as
Enéadas, o que explica o fato de o autor das Duas Fontes Ter colocado Plotino
acima de todos os filósofos.
A Gnosiologia
A gnosiologia de
Plotino é semelhante à de Platão, pela desvalorização da sensibilidade como
aparência, opinião, com respeito ao pensamento. A sensação representa
o primeiro grau de conhecimento humano, manifestando-se nela obscuros vestígios
da verdade. Segue-se, superior à sensibilidade, a razão:
conhecimento mediato, discursivo, dialético, demonstrativo, que atinge as ideias,
as essências das coisas. A razão é a atividade do espírito, que conhece
enquanto vem iluminado pelo pensamento propriamente dito, o qual é superior ao
espírito.
À razão segue-se
o pensamento imediato, que é autocontemplação do espírito
pensante. Nesse grau de conhecimento o espírito compreende, ao mesmo tempo, a
si e as coisas. É conhecimento intuitivo, imediato, não discursivo e sucessivo.
Também o pensamento - o intelecto - representa uma atividade do espírito humano
participada do pensamento absoluto, isto é, da Inteligência - noûs.
O pensamento absoluto, a inteligência, o noûs, em si mesmo, está sempre
em ato de conhecer, e nunca erra; mas, no espírito humano, o pensamento vem a
ser intermitente e sujeito ao erro, precisamente pelo fato de ser, nele, o
conhecimento participado. O conhecimento humano, finalmente, se completa e
atinge a sua perfeição no êxtase, que é identificação do espírito
humano com o espírito absoluto, o Uno, Deus, em que o
espírito humano se torna passivo, inconsciente.
A Metafísica
Como os graus de
conhecimento são quatro - sensibilidade, razão, intelecto, êxtase - assim quatro
são os graus do ser: matéria, alma, noûs , Uno.
O Uno, Deus - segundo Plotino - é a raiz de todo ser e de todo
conhecer, tudo depende dele. No entanto, transcende toda essência e todo o
conhecimento, de sorte que é inteiramente indeterminado e inefável, e em torno
dele pode-se dizer apenas o que não é - teologia negativa. O universo deriva de
Deus, não por criação consciente e livre, mas por emanação inconsciente e
necessária, que procede de Deus degradando-se até à matéria. Deus certamente
transcende o mundo, mas o mundo é da sua mesma natureza. A primeira emanação é
representada pelo noûs, inteligência subsistente, intuitiva e
imutável, que se conhece a si mesma e em si as coisas. A segunda emanação do
Uno é a alma; ela procede do pensamento, como este procede do Uno.
A alma contempla as ideias - que estão no noûs. A alma universal, a
alma do mundo, por sua vez se multiplica e especifica nas várias almas
individuais, que estão em escala decrescente do céu até os homens. Também
Plotino sustenta que as almas humanas caíram de uma vida pré-mundana para o
cárcere corpóreo; também ensina a metempsicose e a conversão. Com a alma
termina o mundo inteligível, divino, e começa o mundo sensível, material. A matéria plotiniana,
pois, não é apenas potencialidade, indeterminação, mas também mal,
irracionalidade.
A Moral
Depois da descida - a
emanação das coisas do Uno - há a subida, a conversão do mundo para Deus.
Efetua-se ela através do homem, microcosmo, compêndio do universo. Nisto
consiste a moral plotiniana, radicalmente ascética:
libertação, purificação da matéria, do corpo, do sentido. Os graus dessa
libertação são representados, em linha ascendente, pelas virtudes éticas,
dianoéticas - arte e filosofia -, culminando no êxtase.
A Religião
O neoplatonismo
afirma certa transcendência de Deus, em que este é imaginado como o supra-inteligível.
Por isso, é inefável e pode ser atingido na sua plenitude unicamente mediante o
êxtase, que é uma fulguração divina, superior à filosofia. Com esta doutrina do
êxtase, em que é afirmada uma relação específica com a Divindade, parece
abrir-se o caminho para uma nova filosofia religiosa, para a
valorização da religião positiva. E outro caminho parece abrir-se na doutrina
dos intermediários, que estão entre Deus e o homem, e por Plotino
distintos em deuses invisíveis e visíveis, a que são assimiladas as divindades
das religiões tradicionais.
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